Funilense dos caminhos e do abandono


 Últimos marcos da Companhia são símbolos do abandono em Cosmópolis

 

Uma ponte de ferro sobre o Rio Jaguari, utilizada por motoristas como rota de fuga do pedágio e, um trenzinho “canavieiro” exposto em uma praça e usado como abrigo de usuários de drogas, são os únicos resquícios cosmopolenses da Companhia Carril Funilense, um dos empreendimentos mais ousados da história do Brasil.
A ferrovia responsável pelo surgimento em suas margens de cidades como Cosmópolis, Paulínia, Artur Nogueira, Holambra, Conchal, Americana, entre outras cidades da região, é praticamente desconhecida a sua importância por muitos moradores.
Cosmópolis é uma das únicas cidades que ainda possui marcos da histórica Carril, adquirida pela Companhia Sorocabana, no início do século 20. Um sonho idealizado por pioneiros como João Manuel de Almeida Barbosa, proprietário da Fazenda Funil, Barão Geraldo de Rezende e família Nogueira.

Do transporte agrícola à fuga do pedágio
A ponte é um projeto de 1890, assinado pelo engenheiro dinamarquês Christiano Röhe, um dos principais construtores férreos da época, responsável pelos traçados de 94 quilômetros de estradas de ferro, entre pontes e elevações, por onde corriam os trens da Funilense na atual região metropolitana de Campinas.
Em 126 anos, a ponte sobreviveu à falência da Funilense, extinção da Sorocabana e inúmeras grandes enchentes.
Com a extinção da Sorocabana na década de 60, desativação e remoção das linhas férreas, a ponte ficou abandonada por mais de 40 anos, sendo interditada pela Defesa Civil nos anos 90. Em 2011, a ponte foi reformada e usada como plano eleitoral de governo para reeleição, sendo entregue no período eleitoral como rota de fuga do pedágio. O projeto que visava uma parceria com o Estado para o fim do pedágio, contemplava asfaltar os acessos à ponte, interligando a nova via até Paulínia. O projeto não saiu do papel, sem manutenção a ponte está abandonada desde 2013. O acesso é utilizado de maneira desordenada como fuga de motoristas da Praça de pedágio e, até como fuga de criminosos.

“Trenzinho canavieiro”
Importado da Inglaterra juntamente com outras locomotivas da Cia Funilense, o trezinho canavieiro, como popularmente foi batizado em Cosmópolis, fazia parte de um conjunto de oito máquinas, construídas exclusivamente para o transporte agrícola, criadas sobe encomenda do Grupo Nogueira de Investimentos em 1890.
Entre a construção e transporte para o Brasil, crises financeiras e paralização das obras da Funilense, o trenzinho e outras 20 máquinas, chegaram no Brasil pelo porto de Santos depois de quatro anos. A Usina Esther foi uma das primeiras empresas do mundo a possuir os modernos trenzinhos.
Projetados especificamente para o uso agrícola, transportavam a cana de açúcar cortada nos canaviais para as moendas da Usina e, assim as produções de açúcar para o mercadão de Campinas, onde seguiam em outros trens com destino à São Paulo. Os trenzinhos percorriam mais de 40 quilômetros, suportando puxar vagões com até 10 mil toneladas de carga.
Durante mais de 70 anos os oito trenzinhos canavieiros fizeram parte da rotina da cidade de Cosmópolis e de outras cidades da região, como Paulínia, Artur Nogueira e Americana. Transportando as produções agrícolas de fornecedores da Usina Ester e dos canaviais da empresa nestas cidades.
O trenzinho somente foi aposentado com o fim das estradas de ferro na década de 60. As antigas locomotivas pertencentes a Cia Funilense, parte foram encaminhadas aos acervos particulares da família Nogueira, em São Paulo e na Fazenda São Quirino, em Campinas.
Com o falecimento de Paulo de Almeida Nogueira, foi criado um monumento no início dos anos 70, juntamente com a Igreja de São Paulo Apostolo, para expor a locomotiva que leva seu nome. Neste mesmo período foram doadas pela Associação dos Sorocabanos e Fepasa (Ferrovia Paulista S.A), as terras onde estão construídas a Câmara Municipal, Companhia da Polícia Militar e o Terminal Rodoviário, sendo criada em frente ao legislativo cosmopolense a Praça dos Ferroviários, homenagem póstuma aos desbravadores daquela região. Na década de 90, o trenzinho canavieiro de nº 6 foi doado pela Usina Ester para a Prefeitura de Cosmópolis.
Em 1997 a Praça foi totalmente revitalizada e reformada, sendo exposto o trenzinho como monumento. O local tornou-se um novo cartão postal da cidade, utilizado para ensaios fotográficos de noivas, registros da cidade e ponto de referência a historiadores e fãs do ferreomodelismo.

O descaso com a história e o patrimônio
Hoje o local é símbolo do abandono e incompetência administrativa, sendo utilizada a cabine de comando do trem como abrigo de moradores de rua e usuários de entorpecentes.
O cheiro de restos fecais chega a ser insuportável, latinhas usadas para o consumo de drogas, jornais, propagandas políticas e um cobertor, cobrem o chão da cabine, onde a corrosão da ferrugem já destruiu parte do assoalho.
A maioria das engrenagens feitas de bronze e cobre foram furtadas por usuários de drogas e sucateiros, assim como uma das placas de bronze com o nome da Praça.
Um incêndio em 2011, possivelmente criminoso, ou gerado pelo consumo de craque em latinhas na cabine, destruiu a área interna dos comandos, danificando a pintura e o brasão da Cia Funilense. Sem verbas para manutenção, com o orçamento comprometido pela crise financeira e no fim do atual mandato, a Prefeitura não tem previsão de reformar o histórico trenzinho. Atualmente ainda está em funcionamento em usinas canavieiras de Cuba e no Havaí-EUA, o mesmo modelo do trenzinho.

118 anos da Estação da Cia Funilense
Demolidas no fim dos anos 60, as Estações de trens da Funilense de Cosmópolis e Paulínia, completariam 118 anos da sua construção na semana passada.
Em 18 de setembro de 1898, terminavam as obras de construção das estações de Cosmópolis e Paulínia, então batizadas em outubro do mesmo ano, como Barão Geraldo (sendo renomeada em 1905 como Cosmópolis) e José Paulino.
O projeto teve início em 1890, na criação da Funilense (alusão ao nome da Fazenda Funil), assinado por Ramos de Azevedo, primo de um dos fundadores da Funilense, o fazendeiro e político, Comendador Francisco de Paula Camargo. Construídas em tijolos aparentes, as estações relembravam as edificações inglesas do período industrial europeu, assim feitas sob encomenda do Barão Geraldo de Rezende, primeiro presidente da Cia Funilense.
Das quase vinte estações da Funilense, somente restam a Estação de Conchal e do distrito de Martinho Prado, ambas parcialmente preservadas. Em 2012 foi inaugurada na cidade de Artur Nogueira uma replica da antiga estação da Funilense, construída com o mesmo projeto edificado no município no início do século passado.

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